Opinião: Filipe Toledo é campeão da etapa brasileira do Mundial de Surfe, mas esporte precisa de incentivo regional
Surfista de Ubatuba derrotou o australiano Wade Carmichael na bateria decisiva e faturou o título em Saquarema, o “Maracanã do Surfe”
A quarta etapa do Mundial de Surfe, realizada na praia de Itaúna, em Saquarema, cidade da Região dos Lagos (RJ), mais uma vez coroou um brasileiro como o grande campeão. Desta vez, quem ficou com o caneco foi o paulista Filipe Toledo, que faturo o Oi Rio Pro em final disputada contra o australiano Wade Carmichael, algoz de Gabriel Medina. Com o resultado, Toledo pulou para a vice-liderança da principal competição da World Surf League (WSL), atrás apenas do também australiano Julian Wilson.
Surfe brasileiro revelou estrelas nos últimos tempos, mas país carece de competições regionais
Foi uma festa belíssima, quando a pacata cidade fluminense, cuja praia de Itaúna é conhecida como “Maracanã do Surfe”, em função das ótimas ondas, recebeu turistas de diversas partes do país e do planeta para reverenciar os maiores nomes do surfe em nível mundial. Além da presença de feras como John John Florence, havaiano que é o atual bicampeão do circuito, os grandes nomes da geração de ouro do Brasil, batizada como “Brazilian Storm”, deu o tom da disputa. O lamento fica por conta de mais uma ausência da lenda Kelly Slater em uma competição no País.
Para a alegrias dos fãs, Gabriel Medina, primeiro brasileiro a se sagrar campeão da WSL, em 2014, Adriano de Souza, o Mineirinho, que ficou com o título no ano seguinte, o próprio Filipe Toledo, além de Miguel Pupo, Ítalo Ferreira e Wiggoly Dantas lutaram pelo primeiro lugar da quarta etapa do WCT, que iniciou com Ferreira na condição de líder, o que lhe deu o direito de usar a camiseta amarela.
Mas esta leva de surfistas de grande talento não tem a ver com o resultado de um programa de incentivo à revelação de atletas do esporte no país. Na verdade, o desenvolvimento dos nomes citados é fruto de patrocínios de algumas empresas de grande porte e das principais grifes ligadas à modalidade. A realidade é que eles se desenvolveram longe do Brasil, quando o litoral paulista se notabilizou como o grande celeiro da mais recente geração.
Tributo a Pepê
Nem a “coqueluche” causada com a Brazilian Storm fez o surfe engrenar no Brasil. Voltando no tempo, a década de 1980 teve na praia o espaço onde a juventude ditava seu comportamento. E o sucesso de um desbravador do esporte fez do sonho californiano e seus tubos, literalmente, a onda da garotada. A referência (e reverência) é dada ao carioca Pedro Paulo Guise Carneiro Lopes, o Pepê, saudoso esportista que fez nome em cima da prancha e também no voo livre, modalidade que o vitimou em uma competição, no Japão, em 1991.
Em 1976, ele se colocou entre os melhores 18 surfistas do planeta. Cinco anos depois, Pepê conseguiu outro feito histórico: a sexta colocação no Pipe Masters do Havaí, resultado que só foi superado por Medina, muito tempo depois. Outro nome que também consolidou a tradição brasileira no esporte é Rico de Souza, um dos pioneiros a defender as cores do Brasil no exterior e responsável pela primeira escolinha de surfe no Rio de Janeiro.
Com o sucesso do esporte, que também chegou às telas da TV com o seriado “Juba & Lula”, grandes empresas aderiram à moda e investiram em competições no Brasil, com destaque para o “Circuito Limão Brahma”. Porém, a década de 1990 marcou a escalado do MMA, quando os jovens fizeram a migração das areias para os tatames.
Racha na cartolagem do surfe brasileiro
Mas o flagelo do surfe, no que diz respeito à difusão da modalidade nas praias brasileiras, não é fruto somente da mudança de comportamento. Os dirigentes também interferem negativamente para isso. Um caso recente envolve o presidente da Confederação Brasileira de Surfe (CBS), Adalvo Argolo, acusado de falta de transparência em sua gestão e por decisões controversas.
Em matéria publicada em 2016, pelo site do jornal Zero Hora, do Grupo RBS, os representantes das federações do Sul e Sudeste acusaram Argolo de privilegiar a realização de competições de base em praias do Nordeste e até do Norte, onde a qualidade das ondas é muito abaixo do que outros redutos poderiam proporcionar. Na época, São Paulo fez uma espécie de boicote e não enviou atletas para as disputas organizadas pela CBS.
Surfe nas Olimpíadas
A esperança de dias melhores também está depositada depois do anúncio de que o surfe passou à condição de esporte olímpico, quando a edição de 2020, em Tóquio, no Japão, será a primeira a abrigar a modalidade. Tanto que a gaúcha Tatiana Weston-Webb, radicada no Havaí, passou a defender as cores do Brasil pela primeira vez, em Saquarema, justamente pelo fato de se ver em mais condições de lutar por uma medalha olímpica – diferente da WSL, o COI determina que os atletas do Havaí façam parte da delegação dos Estados Unidos.
Aliás, fica também o sonho de que mais mulheres, assim como a cearense Silvana Lima, deem início a um Brazilian Storm feminino.