Se o dinheiro não é problema, o que acontece com o Flamengo?
É difícil entender o que se passa com o Flamengo. Tirando da mesa a tragédia que acometeu o Ninho do Urubu e deixou 10 vítimas fatais – e é um assunto que deve ser investigado e tratado com toda a seriedade do mundo e não misturado com a banal disputa de um campeonato – o time, mais uma vez, é uma Ferrari no papel e um Fiat 147 no mundo real, com a bola rolando. A semifinal da Taça Guanabara contra o Fluminense na última quinta-feira foi mais um capítulo nesta crônica de insucessos que vem de longe.
Conforme foi mostrado por este Ganhador, o Flamengo, com (muito) dinheiro em caixa e nomes de peso entre titulares e reservas, entrou em campo com amplo favoritismo sobre o Tricolor de Fernando Diniz, que tem sérios problemas financeiros, sofre para pagar salários, tem um presidente completamente isolado e apostou em um treinador que só foi bem-sucedido em uma edição do Campeonato Paulista quando esteve à frente do Audax e hoje desperta mais desconfianças do que certezas em relação ao seu trabalho. Até mesmo a possibilidade de empate – resultado que classificaria o Flamengo para a final do primeiro turno do Campeonato Carioca – era uma aposta mais segura do que a vitória do Fluminense, com odds em 3,75 segundo o Bet365. Mesmo assim, o que se viu no Maracanã foi um Tricolor com marcação alta e bom toque de bola, sufocando o Rubro-Negro na maior parte do jogo e que conquistou, com méritos, a vaga na grande final contra o Vasco.
E a pergunta permanece sem resposta: o que diabos acontece com o Flamengo?
Dinheiro não é tudo
Há algumas temporadas o Flamengo é o “rei” dentro do Rio de Janeiro e um dos clubes mais ricos do país. Após o cenário de “terra arrasada” deixado por Patrícia Amorim quando foi presidente do clube, a administração Eduardo Bandeira de Melo colocou as contas em ordem, acumulou caixa e investiu na contratação de nomes de peso. Mas os títulos, desde então, simplesmente não acontecem.
Com salários em dia e estrutura pra treinamentos de primeiro mundo, o time do Flamengo “não dá liga”. Vencendo ou perdendo, o meia Diego é a imagem do Rubro-Negro: indiferente e apático. Nada – absolutamente nada –, abala o comportamento dos principais nomes do time. Conquistar títulos ou não conquistar nada parece pouco importar para o atual elenco da Gávea.
E como o dinheiro definitivamente não é um problema para o Urubu e seus atletas, o que sobra, por eliminação, é a falta de ambição ou acomodação do elenco.
Vai-e-vem de técnicos
Assim como o São Paulo, o Flamengo foi transformando-se em um “moedor de técnicos” nas últimas temporadas. Zé Ricardo, que assumiu a equipe em 2016 após a saída de Muricy Ramalho por questões de saúde, foi quem mais esquentou o banco na Gávea – por insistência de Bandeira de Melo, diga-se. Mas a falta de títulos derrubou o treinador que vem colecionando bons resultados – guardadas as devidas proporções – em clubes com menos aporte financeiro (Vasco e Botafogo). Após um bom trabalho na parte final da temporada 2016, os maus resultados na Libertadores e Copa Sul-Americana colocaram um ponto final no ciclo do treinador que foi substituído pela grife Reinaldo Rueda em 2017. Rueda, o breve, partiu para o recesso de Natal ao final da temporada e nunca mais voltou (acertou contrato para renovar a Seleção do Chile de olho na Copa de 2022).
Paulo César Carpegiani, que havia sido contratado para ser gerente de futebol assumiu o comando do time em campo. O fracasso em conquistar o Campeonato Carioca em 2018 culminou na demissão daquele que, segundo o plano original, jamais deveria ter sido o treinador da equipe.
Maurício Barbieri então assumiu o time como interino e foi conseguindo bons resultados até ser efetivado no cargo. O time, mais uma vez, caiu de rendimento e Barbieri – é claro – caiu junto e abriu caminho para o retorno de Dorival Júnior.
Ele que havia feito um trabalho bastante criticado no São Paulo chegou à Gávea e colocou ordem no time, melhorou os resultados e pôs o Flamengo na luta pelo título do Campeonato Brasileiro de 2018. Mas isso não foi o bastante para mantê-lo no cargo. Em ano de eleição de uma nova diretoria, o consenso entre todos os candidatos era de que apesar da melhora do time, Dorival não seguiria no clube – afinal de contas, Abel Braga estava no mercado.
Com uma grife muita mais pesada que a de Júnior, Braga teve um bom começo no Urubu, mas seu estilo retranqueiro não combina com o talento do elenco Rubro-Negro e a indefinição de uma equipe titular do meio para frente cobrou seu preço contra o Fluminense.
Em resumo
A verdade é que campeonatos estaduais servem apenas para aumentar a “zuêra” e para demitir técnicos. Abel Braga não corre risco – neste momento – de ser demitido do Flamengo, mas o tempo para montar um time está acabando. E pelo modo como os atletas “andam” em campo, o estilo “xerifão” não surtiu o efeito esperado em jogadores muito bem pagos que, na realidade, podem pendurar as chuteiras amanhã e viverem de renda. É um grupo que não precisa de mais títulos – pode ganhá-los, é claro e têm qualidade para isso, mas não precisam. Diferente, por exemplo, de um Fluminense que está “quebrado”, não conta com grandes nomes em seu elenco e tem no banco de reservas o treinador que foi possível contratar dentre as opções no mercado – todos, aliás, precisando de um título com a mesma vontade que um faminto precisa de um prato de comida.
E é por isso que o Fluminense – que pagou R$ 6,50 para cada R$ 1,00 investido em sua vitória na última quinta-feira, de acordo com os números do Bet365 – está na final da Taça Guanabara deste domingo enquanto que Abel Braga, Diego Alves, Éverton Ribeiro, Diego e outros, assistirão ao jogo no sofá de suas casas.
Ou nem isso.